por Lofwyr em 30 Ago 2007, 16:24
Tentando não cair na questão de discutir a semântica dos termos: acredito que um dos desafios em se manter a "fantasia medieval" verossímil (não no sentido de real, mas no sentido de crível) é o fato de que a medida que você insere elementos fantásticos na ambientação, existem elementos do contexto medieval da realidade que precisam sair, ou pelo menos serem trabalhados de outra forma.
Vamos a alguns exemplos. Foi colocada em pauta a questão do anacronismo. A questão é que mundos diferentes evoluem de formas diferentes. Analisando-se um universo aonde pessoas podem curar as outras com toques e magias, automaticamente faz com que os avanços da medicina tradicional sejam mais lentos, pois a necessidade de curas, tratamento de ferimentos e etc... é suprimida pela magia. Outro exemplo é a forma como a magia suprimiria o desenvolvimento das armas de fogo. Analisando-se dentro do mundo real, será que a descoberta da pólvora (para se criar armas de fogo, já que os chineses utilizavam a pólvora em fogos de artifício séculos antes) teria o peso que teve se existissem pessoas que disparem bolas de fogo, façam chover meteoros e relâmpagos?
E assim a lista segue. Além do fato de que jogar na Idade Média (principalmente na baixa idade média, ou Idade das Trevas) tira um pouco do "glamour" da fantasia medieval (outro ponto de balanço... a medida que você adiciona "glamour", a medievalidade vai saindo). Pestes, dejetos humanos despejados nas ruas, o "cavalheirismo" visto de forma bem diferente do que é apresentado nos livros de fantasia e por aí vai.
Já na questão da religião eu concordo com a visão do Madruga. Recomendo, para demais interessados no assunto, a série de livro "Máscaras de Deus" do estudioso Joseph Campbell. Ele faz um apanhado bastante interessante analizando as religiões e a teologia não apenas no caracter antropológico, mas também histórico e psicológico.
Quanto a questão de como a teologia é vista dentro da "fantasia medieval", temo que que tudo caia mais em uma questão de comodidade. É muito simples, principalmente quando analisâmos a principal fonte de cenários de "fantasia medieval" que D&D, criar um panteão de deuses baseando-se no que já foi feito e produzido. Troca-se o nome, cria-se alguns novos (basta adicionar domínios) e está tudo muito pronto. Fugir desta receita básica requer criação e partir por caminhos mais obscuros e complicados. O próprio universo do D&D já apresentou bons exemplos de linhas teológicas diferentes... posso utilizar como exemplo o DarkSun, que não possuia deuses, e o poder dos clérigos era extraído da natureza (o que gerou, no caso, uma série de discussões sobre a origem da magia, diferença na natureza da magia clerical, templária, druídica e arcana, e coisas do tipo), e o sistema de panteão do Reinos de Ferro (que foge à regra do "Panteão ùnico universal, e as outras raças ganhando um deuzínho neste panteão, o que gera um monte de discussões sobre a criação do mundo, fé verdadeira e coisas do tipo), são destas discussões que os criadores de jogos tentam fugir quando criam mais um "panteão padrão".
No caso do Reinos de Ferro, colocando como curiosidade para quem não conhece o cenário, existem diversas religiões... parte da humanidade é monoteísta e acredita em um deus chamado Morrow, e na sua contra-parte Thamar (vista como uma espécie de "lado mal"), e possui santos. Outra parte da humanidade crê em Menoth, que é um deus similar ao deus rigoroso do velho testamento. Os bárbaros crêem na Grande Serpente. Os elfos e anões possuem seus próprios panteões, com características bastante diferentes. E dentro desta paisagem cada um possui suas próprias explicações sobre a vida, a morte, a criação do universo e etc... (inclusive com pontos aonde religiões tratam os mesmos fatos com pontos de vistas divergentes).
Em resumo. Eu não acho que panteões de deuses, deuses que caminham na terra e coisas do tipo sejam um problema. O maior problema que vejo na questão de como a teologia é trabalhada dentro dos cenários de RPG (em sua grande maioria) é o da falta de criatividade... a sensação de que cada sistema religioso novo, cada novo panteão, nada mais é do que uma nova versão de outros que já existiram.