Russel escreveu:pra min esse papo de "videogame de papel" e conversa fiada de quem não tem argumento.
Russel escreveu:num videogame você não interpreta, você não escolhe o destino do seu personagem, você não constroi seu personagem ele já esta lá pronto.
"Escolher o destino do personagem" é coisa meio espinhosa em se tratando de RPGs tradicionais -- porque, na maioria dos casos, você
não escolhe, ou, pelo menos, não faz escolhas
significativas. Pega o tal do "old school", por exemplo -- escolher entre o corredor da direita ou da esquerda não é uma escolha significativa. Uma aventura pronta, mesmo em sistemas mais recentes, também "vídeo-gamiza" as escolhas -- como num vídeo-game, sua "escolha de destino do personagem" pode não ser dita como sendo escolha real, visto que pode-se escolher apenas entre rumos pré-definidos -- como em um... vídeo-game.
Idem para construção de personagem. Se minhas escolhas se limitam a arquétipos pré-construídos de raça e classe, me parece menos criação e mais tela de character select.
Claro que isso é facilmente resolvido. Não usar aventuras prontas já é um começo -- no momento em que o mestre constrói a narrativa em torno
daqueles personagens específicos (e não ao redor de um "grupo arquetípico-genérico" de guerreiro-mago-ladrão), já temos algo de que vídeo-game nenhum (que eu conheço) é capaz de realizar. Possibilidade de customizar além dos arquétipos pré-construídos também é uma maneira de sair do campo do character select e entrar no da criação de um personagem de fato. (Idealmente, penso que a melhor forma de fazê-lo é mecanicamente -- mas se o mestre tem como hábito usar as informações de Histórico & Personalidade na construção da narrativa, o resultado é o mesmo.)
Dito isto, o D&D 4E, de acordo com seu texto, é
menos vídeo-game que a 3E. Poxa, o Livro do Mestre da 4E é um dos melhores que já vi. Ele sugere diversas coisas anti-vídeo-game como incluir elementos pessoais do personagem na história (inclusive com amparo mecânico, com a possibilidade de minor quests pessoais), instrução
contra o
railroading (que é praticamente a alma do RPG eletrônico), e um dos melhores guias para a
improvisação que eu já vi em um RPG tradicional. Improv é importante por ser a forma de
não limitar as escolhas dos personagens, que são sistematicamente tolhidas se o mestre cria uma aventura rígida que impede os personagens de realizar coisas não-planejadas.
E se expandimos para o DMG 2, qualquer um que possua um cérebro e tenha de fato lido o livro é incapaz de dizer que as dicas ali inclusas são "coisa de vídeo-game" -- o livro é repleto de
hippie-narrativismos como narrativa compartilhada (que em poucas ocasiões eu vi tão bem explicadas) e a clarificação dos
skill challenges, que também são todos resolvidos via narração com o auxílio do invólucro mecânicos dos
challenges -- compare com o combate, em que a mecânica não é invólucro, mas
esqueleto da coisa.
Se alguma coisa se parece com vídeo-game na 4E, é apenas o sistema de combate. E, nesse caso, é uma coisa positiva. De onde saiu mesmo o sistema de combate usado nos MMOs? Do D&D. (Na verdade, o conceito de "barra de energia" dos vídeo-games muito possivelmente se originou dos hit points.) O mérito dos MMOs e outros vídeo-games foi conseguir criar versões
altamente funcionais do sistema de combate visto nos RPGs de mesa, cuja funcionalidade, dependendo do caso, pode beirar o abissal. Pelo menos de onde eu vejo, o sistema de combate da 4E parece vídeo-game por ser altamente funcional. Sabendo a ordem de procedimentos de combate e coisas como alcance e área, tudo o que se precisa saber sobre o poder está escrito em seu bloco.
O bloco de poderes do D&D 4E é... "
digital". Enquanto em outros RPGs você deve fazer tudo manualmente -- uma jogada pela regra de ataque, outra pela regra de agarrar, e por aí vai, geralmente de partes bem diferentes do livro --, na 4E a coisa já está "pronta" -- o poder X é uma manobra que golpeia o cara e o agarra com a mão livre (Martial Power 2).
Tem uma lógica meio
Shotgun Diaries, o jogo de matar zumbis onde não se faz testes para matar zumbis.
Qualquer teste que se faça
inclui matar zumbis. Tá subindo uma escada? Está matando zumbis enquanto o faz. Um poder da 4E parece ter a lógica "se você está em combate, está atacando" -- daí coisas vistas como "vídeo-game", por exemplo poderes de clérigo, em que "ô lôku, dar uma porrada no inimigo cura seus aliados, é?". A porrada não cura coisa alguma -- ocorre que, em combate, além de curar, o clérigo está constantemente atacando -- estranho seria
não fazê-lo em combate.