por Crispi em 10 Nov 2007, 22:22
Diário
- Ainda não sei qual é teu nome – eu digo a elfa.
- Vassla Tenessir – ela responde.
Esse foi o pequeno intervalo que tivemos entre o encontro com o portão e a próxima batalha. Não deu tempo de abrir o portão antes que os drows chegassem. Primeiro foi uma grande concentração de aranhas a se aproximarem que me chamou a atenção, depois foram os elfos negros, quatro deles e por ultimo uma sacerdotisa negra.
A batalha teve início quando eles nos atacaram, o anão foi para frente imediatamente atacando-os, o humano esperou, a elfa teve logo o seu oponente e eu tive o meu. Milo uma vez mais cantou:
Nos preparemos para a batalha
Toda nossa força contra o mal que se espalha
Que nossas espadas venham a brandir
Nossas flechas dispararem
Quando o inimigo surgir
Todos! Todos! Se preparem
Deixem o suor cair
O sangue escorrer
Nossa força irá fluir
Para nossos inimigos combater
Não importa quantos nos confrontarem
Que os deuses nos protejam
A glória será nossa, que todos vejam
Todos! Todos! Se preparem
Imbuídos por uma coragem inspirada pela canção, a batalha foi feroz. Com certa rapidez eu consegui eliminar o meu oponente com três espadadas, mas o humano teve trabalho e a elfa teve de enfrentar dois. Eu lhe prestei auxílio e logo estávamos ao lado do anão.
O anão por sua vez teve de enfrentar a sacerdotisa e várias vezes ele a acertou e várias vezes por ela foi ferido. Sua maça cravejada fez jorrar muito de seu sangue, até que finalmente ele caiu. A elfa e eu tentamos ajuda-lo, mas, uma vez no chão, a elfa negra esmagou seu peito em um ataque certeiro de cima para baixo com sua maça empunhada com as duas mãos.
Milo se aproximou do anão e cantou uma vez mais a canção curadora para o anão e, a medida que cantava, suas mãos se iluminaram e ele tocou o anão, mas nada mudou.
Juntos, a elfa e eu conseguimos ferir a sacerdotisa o bastante para ela fugir. Ela conjurou o mal proveniente de sua deusa negra e desapareceu bem na nossa frente.
Eu então concentrei todo meus sentidos em encontra-la, ouvindo seus passos com meus ouvidos rentes ao chão. Eu persegui o som escadaria a cima até que finalmente ela se encontrava em algum lugar à minha frente. Eu golpeei o ar duas vezes antes de escutar seus sussurros indistinguíveis invocando o poder divino então a acertei.
Ela me tocou e seu toque queimou minha pele e minha carne, mas mais uma vez eu a acertei e ela tombou. Enquanto isso os outros verificaram que o anão estava realmente morto e o deixaram próximo ao portão encostado à parede.
Voltei até o portão onde Milo me aguardava e logo descemos mais um conjunto de escadas alcançando os outros que seguiram na frente. A armadilha no portão não foi ativada, logo o humano havia tido êxito, ou foi isso o que pensamos. Ao descermos eu escutei um som grave vindo do alto da escadaria.
O salão ao fim da escada era o maior no qual já estivemos. De forma retangular ele possuía estátuas junto às paredes e fontes com uma água suja a muito não usada. E quatro pilares sustentando o teto. Não havia tochas, mas luzes mágicas e esverdeadas pairavam junto ao alto teto, iluminando perfeitamente o local.
Na extremidade oposta havia uma passagem que começava com uma grande tapeçaria velha e rota que seguia corredor adentro. Investigamos brevemente o local, pois possivelmente haveriam mais drows e seguimos o corredor. Chegamos então em um pequeno aposento circular.
No centro do novo aposento, guiado por um pequeno número de degraus, havia um arco com inscrições elficas antigas que não conseguimos identificar. Fora da plataforma onde estava o arco, construído nas paredes, havia sete sinos de tamanhos e formatos diferentes e com inscrições diferentes.
Após uma breve análise Milo descobriu que cada sino tocava uma nota diferente das sete notas musicais existentes. Tentamos de várias formas diferentes acionar o portal, até que o humano e eu decidimos, por curiosidade, voltar para o salão do portão para saber o que havia acontecido.
Antes mesmo de ver podíamos sentir o cheiro de queimado e logo vimos o que julgamos serem os corpos de mais perseguidores drows que foram pegos pela armadilha mágica dos elfos e carbonizados por algo de extremo calor.
Então anunciei minha decisão de ir até o exterior para reencontrar Utgar e Nix, ele protestou mas, no final, eu segui e ele voltou. Eu subi todos os níveis da construção com a maior cautela possível.
Chegando na saída vi que já era noite. Então chamei discretamente por Nix e Utgar, apenas Utgar apareceu. Ele tentava transpor a montanha de pedras da ruína quando foi abatido por uma flecha. Haviam mais perseguidores!
Eu corri construção adentro em direção dos outros, mas, meus ferimentos me atrasaram e permitiram que, no ultimo lance de escadas, fosse alcançado e me atingiram com uma flecha nas costas. Cai então escada abaixo para a escuridão.
Quando acordei, tudo o que senti foi dor por todo meu corpo e um gosto horrível na boca. Inicialmente não conseguia me mover ou abrir os olhos. Lentamente meu corpo voltou à vida, Uma luz me cegava, luz do dia, e estava em meio a uma floresta, fria, porém, agradável. Milo debruçado sobre meu corpo sorria para mim.
- Quanto... Quanto tempo eu estive desacordado? – eu perguntei com a mão na cabeça que doía enquanto me sentava (estava posto entre as raízes de uma grande árvore) e tentava, com dificuldade, abrir meus olhos cegados pela claridade.
- Uma dezena – respondeu Milo, o que me fez despertar totalmente com o susto. Então ele começou a rir e continuou: - Viu? Funcionou! Ele abriu os olhos. Apenas um dia mais ou menos.
Milo e o humano (Daegor Derronan é o seu nome) riam. E eu perguntei onde estávamos. Ele então me contou que haviam atravessado o portal e apareceram na floresta e se esconderam. Pouco depois Quatro indivíduos atravessaram o portal também, me carregando inconsciente e, após um pequeno mal entendido, e da elfa convence-los a me libertaram, eles partiram.
O encontro com os elfos nos trouxe o conhecimento que provavelmente estávamos no norte de Cormanthor, bem longe de onde esperávamos estar, isso explicava o frio.
- E que gosto ruim é esse na minha boca? Eu perguntei, e, divertidamente, o humano me contou que Milo me havia feito tomar a água podre do templo.
Eu estava vivo, mas não poderia seguir viagem antes de descansar, então conversei com Vassla que parecia chateada:
- Há algo errado? Eu comecei.
- Sim, Milo me contou que vocês invadiram o cemitério sagrado dos elfos.
- Ele te falou então sobre minha mãe? Perguntei e após ela confirmar com um movimento de cabeça eu continuei: Então ele te contou também sobre a cilada até a qual fomos guiados?
- Então também pensas que foi uma armadilha? Ele me contou que foste criado por elfos, mas então o que aconteceu?
- Sim, óbvio! Amra nos enviou para cometer um crime e logo atrás de nós já enviou nossos carrascos. Eu nasci em Essembra e, quando meu pai adotivo morreu, um companheiro dele levou minha mãe, deixando-a para ser cuidada pelos elfos de sua aldeia natal enquanto eu ele levou para ser treinado por ele, pois nunca seria aceito na comunidade.
“Quando voltei para a aldeia, dez anos depois, reencontrei minha mãe, que deveria ter 40 anos, mas aparentava ter 80. Amra disse que havia certa maldição na região, que não afetava aqueles possuidores de sangue elfico, mas afetava os humanos e ela assistiu a degeneração de minha mãe com prazer durante esses últimos dez anos. Sim, tenho certeza que foi uma cilada, que ela desejava o artefato para ela e como seria crime tomá-lo para si, nos enviou para realizar seu trabalho sujo e então nos sacrificar como criminosos”.
- Eu não entendo como uma elfa seria capaz de fazer algo assim.
- Quando estivemos com ela, ela nos disse que amava aquele de sua aldeia que se apaixonou por minha mãe e logo depois morreu. Então ela nos enviou com um de seus guerreiros, Lothar, para encontrar um clérigo que empunhava uma mão segurando relâmpagos lhes escapando por entre os dedos como símbolo sagrado e ele nos deu a localização do túmulo.
- Apenas sofrendo por uma paixão um de nós seria capaz de fazer algo dessa natureza.
- Por dez anos? Isso não justifica.
Dormi e quando acordei me sentia bem melhor, apto a continuar a viagem. Depois de um desjejum, apressado pela ainda mal-humorada Vassla. Após reunirmos nossos pertences e antes de partir pedi a Milo que subisse no topo de uma árvore, para observar onde estávamos e para onde seria mais prudente ir e ele saiu resmungando:
- Eu salvo a vida dele e ele me retribui assim “Suba na árvore”! Eu vivo me decepcionando com as pessoas e vice e versa - e começou a subir a árvore.
Depois de um tempo Milo volta e narra ter visto apenas floresta para todos os lados, um vale ao norte e uma árvore que parecia estar sendo tombada, também ao norte, antes, porém, do vale.
Após uma breve discussão resolvemos rumar para o norte, em direção à árvore que estava sendo tombada. No caminho encontramos pegadas de cavalos. Comentei com os outros que esses cavalos estavam ferrados e possivelmente montados e, diante da incapacidade de entenderem as pegadas brinquei com eles “Não são capazes de identificar as marcas das ferraduras? É tão óbvio! Vê essa?”, apontei para uma pegada e em seguida para outra e outra, dizendo que um cavalo estava doente, outro era gordo, outro carregava duas pessoas até que Vassla esclareceu que era impossível precisar tais detalhes, mas que os cavalos estavam realmente fazendo uso de ferraduras, então prosseguimos.
Era tarde quando alcançamos as proximidades do local que desejávamos encontrar. De longe escutamos os sons do trabalho braçal e os grunhidos. Era um grupo de orcs, uns 20, derrubando uma única árvore, imensa, como são as árvores de Cormanthor. Provavelmente se aproveitando da ausência dos elfos para tentarem dominar o local.
Posicionamos-nos sobre algumas árvores com meu arco e a besta de Derronan preparadas. Vassla e Milo se esconderam logo atrás. Planejávamos atrair os orcs em pequenos grupos para dentro da floresta fazendo barulho e então abatê-los-íamos aos poucos.
Foi então que escutamos os sons dos cascos se aproximando. Logo dez centauros passaram correndo logo abaixo de nós com armas em punho para atacar os orcs.
A clareira onde estavam os orcs se tornou o centro da batalha. Havia muito além dos 20 que havíamos contado. Após um breve período de perplexidade, voltamos a agir. Vassla correu com sua arma em punho em direção da batalha. Eu desci da árvore e os ataquei com o arco. Daegor permaneceu sobre a árvore, com sua besta em punho.
Um grupo de seis orcs, fugindo da batalha veio em nossa direção. Milo e eu nos escondemos. Eu permaneci atrás de uma árvore e assim que eles passaram por mim, ao calcular o que deveria ser o penúltimo, me virei atacando o que julguei ser o ultimo. Com um rápido movimento horizontal e em forma de arco de minha espada sua cabeça rolava pelo chão. Mas não era o ultimo.
Milo se pos em posição para enfrentar os que haviam passado por mim e eu os encarei, fazendo um deles fugir amedrontado. Após dar cabo dos que permaneceram comigo fui ajudar Milo que já terminava com os seus.
Então voltamos nossas atenções para a batalha na qual Vassla participava. Com o arco eu abati alguns e errei outros poucos. Virotes voavam de cima dá árvore para o caos. Quando um dos orcs veio até nós, Milo o enfrentou e foi ajudado por Daegor.
No centro da batalha Vassla e os centauros visivelmente galgavam aos poucos a vitória. Pouco depois Vassla se encontrava cercada, então Milo e eu fomos a seu auxílio. Logo o perigo já não mais existia e ela nos agradeceu com uma leve reverência.
Pouco tempo depois a batalha estava terminada, com os centauros vitoriosos e alguns poucos orcs fugitivos. Vassla foi em direção dos centauros e eu a segui. Ela se curvou em frente um deles, permanecendo semi-ajoelhada e eu a imitei.
Poucos instantes todos os centauros estavam ao nosso redor. Dentre eles se aproximou um, belo, de longos cabelos loiros e utilizando um elmo que tinha como enfeite uma crina de cavalo – o único que utilizava elmo.
Ele se aproximou de nós e retirou o elmo sacudindo o cabelo molhado de suor. Atrás dele todos os outros se organizaram em uma fila, como um exército atrás de seu líder.
Quando os centauros viram Daegor se mostraram incomodados e um grupo de uns três foram em direção dele.
- Esse humano é um companheiro nosso de batalha senhor, não um inimigo.
- Quem são esses que o acompanham elfa – perguntou o líder deles a Vassla.
- Esses são meus companheiros de viagem e batalha, o pequenino chama-se Milo, tem o humano, Daegor e esse... cavalheiro Tristan.
Começando a viagem Milo me pergunta se talvez poderia ir montando em um centauro.
- Será que eu poderia ir montado num deles – começou a pergunta.
- Nem tente – eu respondi – ou estaremos mortos.
Seguimos viagem com os centauros por boa parte da tarde, quando paramos para um breve descanso à beira de um lago.
- Talvez seja hora de revelar a eles o que eu sou – comecei para Vassla – mais cedo ou mais tarde eles descobriram, que seja então agora do que mais tarde, no refúgio deles.
- É uma atitude sensata – concordou ela.
Após os centauros se banharem, o que quase todos fizeram – exceto os dois que ficaram vigiando Derronan que permanecia emburrado – me dirigi ao líder deles.
- Com licença senhor das florestas, eu gostaria de palestrar contigo se for esse o teu desejo.
- Podes dizer – ele me respondeu.
- Eu possuo, como muitos podem dizer, uma deformação senhor...
- O que ele quer dizer senhor – me interrompeu Vassla – é que ele foi desafortunado ao nascer. Nasceu sob uma maldição, mas não têm culpa sobre isso.
- O que querem dizer – me perguntou ele diretamente.
- A poucos dias encontramos os elfos negros e batalhamos com eles, suponho que já os conheça.
- Sim, já os encontramos também.
- Bem, apesar de seu sangue negro os drows são elfos, como Vassla, e são capazes de gerar descendentes com os humanos, senhor.
- Nunca ouvi falar disso – disse ele e com um movimento de mão chamou um outro dos seus, de longos cabelos negros e muito belo – Herel!
- Bem senhor, há um pouco mais de 20 anos um exército de drows invadiu Essembra, matando, pilhando, estuprando e enfim, deixando alguns descendentes entre eles e as humanas, dentre estes, eu. Apesar de minha aparência, sou um humilde devoto de Silvanus e não carrego a maldade e podridão dos elfos negros.
Com um olhar de espanto ele começou a conversar com o centauro, Herel, que se aproximou ao seu chamado, confirmando minha história.
- Sim senhor, já ouvi tais lendas, mas nunca pude presenciar tal criatura.
- Mostre-se – me ordenou e lentamente joguei para trás o capuz, revelando meu rosto.
Todos se aproximaram, observando-me com uma mescla de apreensão e admiração.
- Então és duas vezes amaldiçoado, com o sangue negro e o sangue humano!
- Decidi senhor, contar-te a verdade agora, pois caso eu não seja bem vindo entre os seus, poderei seguir outro rumo não profanando assim o teu recanto com minha indesejada presença.
- Como já disse, foste de valor no campo de batalha e te mostraste um bom aliado, é bem vindo, não importa tua aparência.
- E como devo me dirigir ao senhor?
- Meu nome é Ulaumeth Crina Dourada.
- Se for o teu desejo, nosso pequeno companheiro, Milo é um trovador e poderia contar-te essa história de maneira mais requintada – disse apontando para Milo.
- Temos entre nós um trovador também – respondeu-me apontando para Herel.
Após explicar a Milo o que acontecia ele se mostrou muito bem disposto a apresentar suas habilidades e compartilha-las com o trovador centauro.
- Teu talento é proporcional ao teu tamanho, pequeno? – perguntou Herel a Milo na linguagem comum.
- Sinceramente, senhor, espero que não!
E dito isso começou a cantar a melancólica balada contando a triste história do ataque a Essembra. Seu desempenho foi excepcional e atraiu a atenção de todos emocionando a muitos.
Quando começou a tocar fui até Daegor que parecia desconfortável e lhe ofereci meu cantil.
- Como estás?
- Como posso estar, cercado por esses cavalos burros que nem sabem falar?
- Eles sabem falar, só que uma língua deles. Aqueles dois – falei, indicando Herel e Ulaumeth Crina Dourada – sabem falar a língua comum também, então tenha cuidado com o que falares perto deles.
- É surpreendente que sejam capazes de falar mais de uma língua!
- E tome cuidado com o que for falares deles perto de Vassla.
- Não te preocupes amigo – me respondeu com um pequeno tapa no ombro – eu conheço a elfa.
Depois de um tempo seguimos viagem. Milo empolgadamente conversava com Herel, Derronan continuava emburrado. Eu segui ao lado de Vassla. Cobri meu rosto com a capa mais uma vez.
- Não é mais necessário que te ocultes – disse-me Vassla – eles já te aceitaram como o é.
- É o costume – respondi com um sorriso enquanto retirava a capa.
Era noite quando chegamos à aldeia deles. Era pequena, com um posso em lado e diversas choupanas de onde saiam vários outros centauros, na maioria, femininas e crianças, que iam saudar seus respectivos esposos, pais ou familiares. Havia também uma grande fogueira no centro da aldeia.
Ulaumeth se adiantou pronunciando a vitória sobre os orcs, apresentando os convidados – nós – e informando sobre a comemoração o que foi seguido de vários “Vivas” – aos quais Milo se juntou mesmo não sabendo o que se passava.
Após saber o do que se tratava Milo se viu na obrigação de começar a festa e começou a tocar seu bandolim e a cantar dançando ao redor da fogueira, fazendo gracinhas, sorrindo e piscando para várias centauras e crianças.
Por um instante todos fizeram silencio e olharam ao mesmo tempo para Milo, admirados e assustados, mas logo se juntaram a ele. Uma centaura trouxe um barril de bebida enquanto outra trouxe carne a ser assada na fogueira.
Eu questionei a um centauro se haveria por perto um riacho, lago ou outra qualquer fonte de água corrente da qual poderia fazer uso por ali e, após me indicar fui até ele, um pequeno córrego que passa a uns poucos metros da clareira dos centauros.
Lá me banhei e lavei minhas roupas sujas e armadura, vestindo uma muda de roupa limpa de minha mochila e deixei-as em um bom local para secá-las. E alto o suficiente para ficarem fora do alcance das crianças centauro.
Voltei então para a aldeia, onde a festa acontecia, Milo tocava ao redor da fogueira junto a Herel e bebericava uma caneca, desproporcional ao seu tamanho, da bebida silvestre. Vassla conversava alegremente com um pequeno grupo de centauros e Daegor comia moderadamente sentando em um canto, ainda desconfortável.
Fui até o centro, me servi de um pouco de carne e frutas e da bebida, de um dourado translúcido, hidromel – maravilhoso – e me sentei em um canto apreciando a música, me alimentando e concentrado em desenhar a alegre cena que se desenvolvia a minha frente.
Madrugada já alta e a lua cheia iluminava o centro da clareira quando Vassla veio até mim.
- O que estás fazendo – me perguntou.
Mostrei o desenho a ela.
- Não sabia que possuía dotes artísticos. Está muito bom. Ulaumeth deseja conversar conosco.
Eu a segui então até a tenda de Ulaumeth. Sentamos-nos diante dele.
- Desejavas nos ver senhor – perguntei.
- Sim. Vassla me contou que vocês irão prosseguir até Essembra, o que vão fazer lá?
- Bem, falo por Milo e por mim, nós vamos até uma aldeia élfica próxima a Essembra, para encontrar minha mãe e meia-irmã.
- Ela me contou sobre a doença de tua mãe. Encontraste a cura para o male dela?
- Teoricamente, sim senhor, mas tenho meus motivos para crer que as coisas não sejam tão simples.
- Quando amanhecer e fores partir, procure por Thendritann, a leste daqui, ele conhece os melhores caminhos para encurtar vossa viagem. Vá até ele em meu nome e, se vos julgares digno, ele vos guiará.
- Obrigado senhor.
- Então, Vassla, decidiste que rumo seguirá a partir daqui – perguntei a ela em particular.
- Ainda não, deixarei essa decisão para amanhã.
Após ter certeza onde poderia descansar, me acomodei em sua cabana e dormi sob meu cobertor.
Na manhã seguinte, acordei junto com o sol. Na choupana onde me encontrava haviam centauros dormindo então sai de lá fazendo pouco barulho. Do lado de fora a vida continuava e vários centauros e centauras já estavam realizando seus afazeres domésticos diários.
Após procurar um pouco encontrei Vassla próxima a um arado conversando com um centauro. Ela trajava um vestido e não a pesada armadura, e estava limpa.
- Bom dia – eu comecei cumprimentando Vassla e o centauro e me dirigindo a ela prossegui – eu poderia falar contigo em particular?
“Claro” ela respondeu e se despediu do centauro com quem conversava e me seguiu até a beira do riacho onde havia deixado meus pertences lavados.
- E então, decidiste que rumo tomará?
- Sim. Fui convidada a permanecer aqui um tempo, devo ficar até pelo menos o fim do inverno, não prosseguirei com vocês.
- Daegor já sabe disso?
- Ainda não – respondeu-me ela com uma expressão que previa a reação negativa do companheiro.
- Deixe-me pedir-te uma coisa então – eu disse e, após um breve aceno de concordância continuei
– Apesar de eu ser um guardião das florestas e servo do Senhor das Florestas e da Vida Selvagem, sou inexperiente e vejo que Ele já intercede através de tuas mãos. Poderia me ensinar um pouco sobre Silvanus?
A manhã passou enquanto ela me ensinava sobre os segredos dele. Eu, recostado em uma árvore, aproveitei a ocasião para desenhá-la em uma das folhas de meu diário. Um desenho de busto, o mais detalhado possível, captando uma revigorada e bela Vassla de cabelos lisos e soltos ao redor do rosto sorridente iluminado pelo sol matinal de um dia que parecia diferente de todos os outros: um pouco mais alegre e sem cansaço.
Quando terminei meu desenho fiquei a ouvir até que ela por fim se esgotara. Era já sol alto quando terminamos. Mostrei meu desenho a ela.
- Ficou lindo!
- Obrigado – respondi ao elogio – não foi difícil, tive uma bela modelo.
Ela sorriu em resposta e então, após decidirmos que já era hora de encontrar nossos companheiros, me levantei e a ajudei a levantar, arrumei minhas coisas e voltamos para o acampamento.
Milo estava sentado no centro, perto da fogueira, comendo. Aproximamos-nos desejando-lhe um bom dia e eu me aproveitei de seu desjejum – ao que ele me respondeu com uma cara emburrada.
Após uma breve conversa na qual Milo expôs seu desejo de permanecer ali por mais tempo, e de esclarecer que isso não seria possível decidimos os três procurar por Daegor.
O encontramos dentro da mata se arrumando.
- Logo vamos partir – eu disse.
- Talvez possamos ficar um pouco mais – disse Milo sorrindo para Daegor.
- Já estou pronto – respondeu esse para o desânimo de Milo que parou de sorrir no instante seguinte.
- Bom dia Daegor – começou Vassla – tenho que conversar com você.
- Bem, Milo, vamos arrumar nossas coisas enquanto eles conversam – eu lhe disse.
- Elas já estão arrumadas – respondeu-me ele com interesse na conversa dos dois.
- Bem, vamos recolher provisões então.
- Pode ir você, eu quero escutar o que ela...
- Vejo ali mais hidromel – eu interrompi.
- Não te preocupes, tenho um cantil cheio de hidromel.
Com a paciência esgotada peguei-o embaixo do braço e carreguei para longe de Daegor e Vassla.
- Hei! Mas eu quero escutar!
- O que eles vão conversar é entre eles apenas. Ela está dizendo que não viajará mais conosco.
- Como assim?
- Os centauros a convidaram para permanecer aqui.
Vimos à distância, Daegor respondendo furioso Vassla e se separando dela. Ele passou por nós dizendo “Então? Vamos?” e nós fomos atrás de Vassla.
- Ele não aceitou bem a notícia. Ele é um homem de valor, apesar de ser meio atrapalhado de vez em quando. Por favor, tomem conta dele.
- Pode deixar – respondemos.
- Foi uma honra viajar contigo, Vassla, espero que tudo dê certo para ti – disse Milo enquanto beijava sua mão – Espero encontrar-te novamente.
- Foi um grande prazer viajar contigo pequenino – respondeu ela sorrindo.
- Milo, como és tu o melhor com as palavras, atrase Daegor que já está saindo da mata – disse-lhe eu apontando para Daegor – enquanto eu e Vassla recolhemos alguma provisão para nossa viagem e despeço de Ulaumeth. Milo saiu correndo atrás de Daegor enquanto Vassla e eu caminhamos em direção ao centro da aldeia.
Tristan