Capítulo Um: Logemked
Por Minkot Regudar
Já viajávamos a alguns meses, partindo da capital de nosso reino. Nenhum local parecia ser agradável para nosso assentamento e por algum tempo ficamos a andar em círculos pelos ermos. Finalmente, do topo de um morro vimos uma colina solitária ao longe. Nem muito alta, nem muito baixa, perfeita para uma fortaleza discreta e promissora. Eu olhei para as redondezas e senti que uma brisa fraca carregava o cheiro de rocha. Não aquela da superfície, maculada pelo sol e pela chuva. Uma rocha antiga, subterrânea, pronta para ser escavada e habitada. Uma rocha que pedia para ser cortada e esculpida pelas melhores mãos. Nesse momento, decidi o nome de nossa fortaleza. Uma palavra das mais arcaicas, que significava “rocha profunda”: Logemked.

Descarregamos nossas coisas ao pé da colina. A carroça parou e os animais puderam finalmente descansar. Ordenei que cortassem madeira, pois a noite seria longa e fria. Enquanto subíamos o acampamento, notei Alath, nosso principal mineiro, encarando severamente a colina. Eu me aproximei e perguntei a ele o que fazia. Ele me respondeu, pensativo: “Procurando a melhor forma de escavar”. Deixei-o a só com seu ofício e fui cuidar de outras coisas. Mais tarde, fui dormi no chão lamacento, sem antes notar Alath encarando a colina imóvel. Quando acordei no dia seguinte, me disseram que ele tinha ficado ali a noite inteira, somente observando, até que um terremoto imaginário lhe fez dançar de um lado pro outro e começar com as escavações.
A escavação da colina se prolongou por alguns dias. A terra era macia e de fácil remoção. Logo fizemos um quarto improvisado e montamos algumas oficinas para começar a construção dos móveis. Uvash e Zas, os encarregados da comida, logo ficaram felizes em saber que abrimos espaço para uma plantação subterrânea de cogumelos, que também poderia vir a produzir as sementes necessárias à criação de nossa necessidade mais básica: álcool.

Com os passar dos meses, ordenei que os três mineiros avançassem quatro ou três níveis para baixo da colina, a fim de iniciar a habitação do subterrâneo. Abriu-se espaço para um salão central de pedra e, à sua frente, montamos a sala de jantar. Ainda tinham algumas pedras jogadas aqui e ali, mas isso com o devido tempo se arrumaria facilmente. Alath já me disse que reservou espaço para ampliação futura na planta original do forte, como já era de se esperar. Mais alguns meses e esse lugar estará cheio de imigrantes prontos para começarem a vida nova longe das leis do reinado. Na maioria fugitivos, é claro, mas ao menos esforçados. Mal sabem eles que seria preferível talvez permanecerem sobre os olhos da civilização a se aventurarem por essas terras.

Meses se passaram e o forte avançou a passos largos. Construímos uma série de oficinas no nível do salão principal. Mandei que os bens lá produzidos fossem estocados diretamente a frente das máquinas, para evitar a perda de tempo transportando-os. Também mandamos por algumas mesas a mais no salão de jantar e começamos a escavar nossas novas acomodações nos níveis inferiores. Ah! Não posso esquecer de parabenizar os mineiros por abrirem o espaço da cozinha antes do esperado. Finalmente agora poderemos produzir nosso próprio álcool. Alguns trabalhadores já apresentavam sinais de abstinência.


Antes da construção da cozinha, ficamos uma semana sem nossa bebida e precisamos recorrer ao uso de água para sobreviver. Consegui ver que alguns dos homens iam até o rio próximo para se hidratarem, fracos demais para resistirem à tentação. No futuro, isso pode vir a ser um problema, pois o rio parece abrigar alguns peixes e, principalmente, karpas. Os viajantes contam histórias desses demônios aquáticos assassinos que subitamente puxam para as águas um anão inocente que só faz beber um pouco dela. Não vi nenhuma dessas criaturas ainda, mas talvez no futuro seja melhor canalizar a água e construir um poço, no caso de ficarmos sem álcool novamente. Melhor prevenir do que ser afogado por um demônio da superfície.
Esqueci de mencionar também que ordenei a construção de algumas armadilhas na entrada principal. Algumas gaiolas de madeira foram o suficiente para capturar uma raposa que passava por lá. O que faremos com ela é ainda incerto, mas alguns dos anões alimentam ela todo dia.
Eu também pedi que os anões liberassem os cômodos improvisados da superfície. Pretendo desenvolver ali algo para a defesa do forte, mas isso é assunto para outro ano.
Recebemos também a visita da caravana que o secretário do rei prometeu. Ela chegou com algumas semanas de atraso, mas ao menos veio. Eu prontamente como líder me pus a fazer a negociação. Venderíamos em sua maioria brinquedos e pequenos utensílio mundanos em troca de pano de seda, que ainda não tínhamos capacidade de produzir. Infelizmente, o negociante que o rei mandou era um pilantra. Por três vezes lhe propus um negócio que era até melhor para ele e por três vezes ele recusou minha proposta, saindo logo depois com seus guardas e mulas pomposas. Atreva-se aquele infeliz a aparecer aqui novamente e o enviarei para o fundo do rio com as karpas demoníacas.

O ano aqui em Logemked foi muito agitado. Não paramos por um segundo para construir tudo que fosse de nossa mais básica necessidade. Finalmente, a temporada chegou ao fim com a vinda de novos imigrantes. Nova força para a construção de grandes monumentos. Daqui em diante, o que se fará de Logemked está em nossas mãos. Nós temos o poder! Eu tenho o poder!