por Allefcapt em 29 Jan 2010, 16:48
Olá a todos,
O filme é direto, cruel e faz boa parte da platéia refletir.
Vale à pena.
E assista sozinho.
ATENÇÃO - SPOILERS AO LONGO DO TEXTO
500 DIAS COM ELA
(500) Days of Summer
Ao analisar o cartaz e a sinopse, muitos cinéfilos torceram o nariz para a obra dirigida por Marc Webb, até então mais conhecido por ter contado histórias curtas dirigindo vídeo clipes, acreditando ser mais um “chic flik”, nome que se dá aos filmes com apelo voltado ao público feminino.
Não é verdade.
Aliás, um erro presente nestas análises é colocar os “fliks” no mesmo balaio das “Comédias Românticas” o que por vezes as condena a um pré-conceito masculino.
O cartaz do filme já avisa em tom profético: Esta não é uma história de amor, mas sim uma história sobre o amor. Portanto é preciso se preparar.
Mas se alguém não tiver percebido isto, o filme começa com um aviso curto e grosso: “O filme a seguir é uma história de ficção. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência. Especialmente você, Jenny Beckman. Vaca".”
Marc Webb consegue brincar com diversos clichês, abusando dos diálogos recheados de caricaturas dos personagens, que utilizam a linguagem corporal em tons de cores vivas, tornando a obra divertida e atual.
Tom Hansen (Joseph Gordon-Levitt) trabalha em uma empresa que produz cartões festivos, um tipo de produto que provavelmente muitos dos expectadores nem sabiam que denotam e exigem equipes de criações tão grandes e comprometidas.
Percebe-se através de um olhar mais atento que o protagonista deve então possuir um elevado senso de percepção e de romantismo para poder criar tais produtos. E ficamos na expectativa deste Don Juan de papelaria.
O filme é direcionado a perspectiva dele para o amor. E isto por si só já é interessante.
Olhando ao redor acaba encontrando aquela que ele acredita ser a mulher definitiva, a cereja de seu bolo, a mulher que o acompanhará nos álbuns de fotos por toda a vida, a bela e cativante Summer (Zooey Deschanel).
Vale a reflexão de que há uma brincadeira implícita no título. “Summer”, ou seja, “verão”, é o nome da protagonista, da razão de tamanha paixão, mas também é um lembrete da sazonalidade dos amores que surgem nesta estação do ano... um lembrete do que o final nos apresentará.
Ambos os protagonistas encaixam-se perfeitamente com os papéis que interpretam. Ele encontra equilíbrio na criação de um cara que passou a vida ouvindo músicas melosas, escrevendo cartões floridos para as namoradas do segundo grau, comprando ursinhos de presente, lendo e assistindo obras que só tratam do amor e desta forma supervalorizando e enaltecendo o sentimento.
Quando percebe que ao seu lado, no ambiente de trabalho há uma mulher que ama o som dos SMITHS, cai de joelhos por ela.
O personagem de Joseph é um contra ponto a maioria dos filmes do gênero, pois é ELE quem projeta NELA todos os sonhos e delírios românticos. Idealizando um amor imortal e eterno, acaba enfrentando uma mulher fria, desiludida com a histórica quebra familiar dentro de casa ainda criança e totalmente descrente no amor.
O filme leva ao longo de seu tempo o expectador a um jogo de Xadrez, onde o impossível parece permear a história desde o primeiro minuto de filme. O amor entre aquelas criaturas não parece dar certo. Não possui esperança. Mas é preciso tentar. A vida imita a arte? O expectador certamente refletirá ao longo do filme, em diversos momentos.
A arte de desfilar ao longo do filme a temporalidade desordenada faz com que o filme vá do presente ao passado diversas vezes. Somos convidados a viajar ao longo dos fatídicos 500 dias. E percebemos claramente que de alguma forma todos nós já vivemos aquele ano e meio.
Somos jogados logo no início do dia 1 ao 420. E ali, para os mais atentos é possível perceber que o filme não trará o final feliz e fantasioso de sempre. O expectador passa a prestar mais atenção, e degusta cada detalhe. Ele no fundo sabe que ao final será despertado pela reflexão.
Vale aqui estar atento a cena em que o protagonista entra em um elevador feliz, sonhador e quase levitando no início do relacionamento. Quando a porta se abre ao final de sua viagem a cena é bem diferente, afinal somos transportados para o dia 437 da relação amorosa, e ali naquele cenário os sonhos não estão mais tão coloridos.
O retrato de uma relação amorosa é sincero, duro, cruel e verdadeiro. Bate com força no peito e na cara do expectador, saindo do lugar comum fantasioso dos filmes do gênero. Não há entradas triunfantes, corridas desesperadas no último quadro de filme, revelações bombásticas a beira do altar, desencontros amorosos com final feliz programado.
O que sobra é o que aprendemos depois de alguns relacionamentos desfeitos, errados, inesquecíveis e dezenas de paixões não-correspondidas. O sofrimento é supervalorizado e superestimado pelos seres humanos. Esta é uma mensagem clara e direta que os roteiristas procuram passar.
Ao final do filme há uma cena recheada de crueldade e pesar. Os protagonistas se reencontram após o fim do namoro. Aqueles encontram casuais já cantados em versos e prosas e a tela então se divide ao meio. Em um dos lados podemos ver a realidade crua e dura e na outra a expectativa do romântico Joseph. Neste momento é possível se escutar pequenos choros no cinema. Há um silêncio cúmplice no ar. A cena descarrega diversos pequenos elementos cruéis. E estes minam os expectadores.
A trilha sonora é para ser curtida com a capacidade auditiva dos jovens e adolescentes pois é POP e romântica, repleta de baladas e “chicletes” dignos dos programas noturnos de rádio. Afinal lembremos, na direção há um perito em clipes...
Todos os sentimentos de Joseph são descritos de forma clara através do recurso musical, e isto também nos faz lembrar dos nossos recursos.
Ao longo do filme surgem Regina Spektor, The Smiths, Simon & Garfunkel e The Clash e Pixies, estes cantados em um karaokê.
Scott Neustadter e Michael H. Weber já haviam escrito o roteiro da Pantera Cor de Rosa e por isto talvez, muitos fãs e críticos esperavam algo mais rasgado, cômico e quase pastelão. Longe disto o filme e possui uma aura que não têm a leveza de uma peça somente voltada a comédia , mas faz o expectador refletir sobre o que até então fez ou faz de sua vida. Especialmente a amorosa.
Os roteiristas são hábeis em utilizar os recursos de fluidez e rapidez nos textos, reconhecidos de imediato pelo público. As tiradas são inteligentes, próprias e divertidas e lembram o tempo todo, através da representação da realidade que é possível sobreviver aos dissabores do amor.
O filme vale como um antídoto, um escudo, uma luz para que saibamos que amanhã haverá outro dia. E que o sol é para todos.
Abraços,